23/06/2015 - Valor Econômico
Pronto para começar a operar, o porto Sudeste, criado por Eike Batista em Itaguaí (RJ), vive um dilema. O terminal recebeu investimentos superiores a R$ 4 bilhões para montar estrutura capaz de exportar até 50 milhões de toneladas de minério de ferro por ano. Mas hoje não tem garantias firmes de embarque do produto, dizem fontes do setor. A situação tornouse mais delicada depois de a Mineração Usiminas (Musa) ter anunciado a rescisão do contrato que tinha com o porto. Controlada pela Usiminas, a Musa cobra do Porto Sudeste cerca de R$ 700 milhões em multas por descumprimento contratual relacionado a atrasos de mais de três anos no início da operação do terminal, que ainda não tem data para fazer o primeiro embarque de minério de ferro.
No intervalo de poucos anos, a perspectiva do Porto Sudeste modificouse por completo. Quando ainda estava em construção, havia expectativa de que houvesse muito minério disponível para ser embarcado pelo terminal, controlado desde 2014 por consórcio formado pela trading Trafigura e por Mubadala, empresa de investimentos de Abu Dhabi. Mas as obras atrasaram e, ao mesmo tempo, o preço do minério de ferro despencou quase 75% entre 2011 e 2015, situandose hoje na faixa dos US$ 50 por tonelada.
No mercado, a avaliação é que hoje o Porto Sudeste procura volumes de minério para embarcar. O porto tem a situação de caixa agravada por não gerar receitas, disse uma fonte. Em 2011, a mineradora MMX, de Eike, que na época ainda controlava o porto, fechou um acordo firme ("take or pay") com a Musa que previu volumes crescentes de embarque. Pelo acordo, no primeiro ano de operação, em 2012, o porto embarcaria 3 milhões de toneladas da Musa. Esse volume iria aumentando até chegar a 12 milhões de toneladas em 2016. Para 80% do volume embarcado, fixouse a cláusula de "take or pay", o que significa que os volumes teriam que ser honrados.
No contrato, fixouse a tarifa de US$ 12,63 a tonelada para os serviços portuários executados. Na sextafeira, em fato relevante, a Usiminas disse que a rescisão do contrato se deu em razão de "reiterado inadimplemento" pelo Porto Sudeste. O Valor apurou que existe desde 2014 um processo arbitral contra o porto instaurado pela Musa, incluindo as multas. A expectativa da mineradora, com base em casos similares, é que o caso seja resolvido em um ou dois anos. O escritório BM&A representa a Musa e o Andrade & Fichtner Advogados, o Porto Sudeste.
Hoje, com os preços do minério de ferro deprimidos, o porto precisará oferecer tarifa mais competitivas se quiser atrair exportadores, dizem fontes no mercado. As mineradoras de ferro de Minas Gerais que exportam utilizando a malha ferroviária da MRS têm um custo total, incluindo mina e logística, superior a US$ 50 por tonelada para colocar o produto no porto em Itaguaí. Isso significa que, incluindo o frete marítimo até a China, o minério chega ao mercado chinês por um custo superior ao preço de venda. Daí que uma saída para o Porto Sudeste seria reduzir a tarifa para um valor na faixa de US$ 8 por tonelada, calculam as fontes.
A pergunta que o mercado se faz hoje é se o porto estaria disposto a pagar parte da multa com a Musa, recebendo um desconto em troca. Em 31 de março deste ano, o valor da multa, incluindo juros, atingiu R$ 624 milhões, valor que será atualizado com as penalidades previstas para o segundo trimestre. Adicionalmente, a companhia está pleiteando ressarcimento de lucros cessantes, além de demais perdas e danos, decorrentes do atraso na entrada em operação do porto. "A companhia foi prejudicada diante da não entrada em operação do Porto o que fez com que a companhia fizesse suas exportações com custos mais altos do que os previstos em contrato, através de contratos spots ou através de leilões", disse a Usiminas em nota.
A Musa exportou 1,34 milhão de toneladas em 2012. Em 2013, foram 499 mil toneladas e, em 2014, 680 mil. "Temos capacidade de produção de 12 milhões de toneladas por ano após um investimento de R$ 800 milhões", disse a Usiminas. A exportação de minério da Musa vai para a Ásia.
No mercado, há quem levante a hipótese de que o porto talvez pudesse garantir demanda firme de minério se os controladores (Trafigura e Mubadala) aceitassem negociar a compra de uma fatia acionária minoritária na Musa, que é 70% da Usiminas e 30% da Sumitomo Corp. O negócio não é simples, inclusive considerando a dificuldade da Usiminas de aprovar uma operação como essa quando seus acionistas (Ternium e Nippon Steel) estão em "guerra" declarada.
A direção do porto declarou: "O Porto Sudeste está pronto para iniciar as operações com a obtenção das licenças necessárias. A última etapa é a autorização da Marinha brasileira para a liberação do canal marítimo de acesso. Com essa aprovação, o Porto Sudeste estará pronto para o primeiro carregamento. Seus proprietários acreditam no projeto a longo prazo, no qual vêm investindo R$ 4,2 bilhões. A empresa irá entrar com o processo de arbitragem para garantir que o contrato com a Usiminas seja cumprido. Respeitando o contrato, a arbitragem será conduzida em caráter confidencial."
Fonte: Valor Econômico
Publicada em:: 23/06/2015
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